Inside Fashion | Representatividade na moda


“Porque faço parte do mundo e o mundo precisa ver as pessoas que existem nele” 

Estamos em 2020 e ainda precisamos falar sobre diversidade. O mundo não aceitou as diferenças como parte do que somos feitos. Principalmente na moda, onde se prega uma estética padronizada em que os corpos são magros e brancos, a inclusão de pessoas com deficiência fica ainda mais distante. 

A Moda Inclusiva surgiu em 2008, e nada mais é do que a moda ser pensada para todos os tipos de corpos. Para as pessoas com deficiência a roupa deve proporcionar além de estilo, conforto, segurança e autonomia. Através dessa inclusão, mais corpos serão contemplados, promovendo uma diversidade e representatividade significativas para a sociedade. 
Heloisa Rocha, jornalista e criadora de conteúdo | Foto: Arquivo pessoal
“A osteogênese imperfeita ou, ossos de vidro ou ossos de cristal, como é popularmente conhecida, é uma doença rara, genética e hereditária e que tem como principal característica a fragilidade óssea. Nasci com o tipo três da doença e possuo deformidades graves em razão das inúmeras fraturas que tive ao longo da vida, inclusive ainda dentro do útero da minha mãe. Por esta razão, eu utilizo a cadeira de rodas para me locomover”, esclarece Heloisa Rocha, 36 anos. 

Ela é jornalista e gestora do @modaemrodas (Moda Em Rodas) no Instagram e no Facebook. Através desses perfis, ela amplia a discussão do conteúdo da moda, trazendo o olhar do corpo com deficiência para a mídia. Através do seu trabalho como jornalista, cobriu algumas vezes a São Paulo Fashion Week. A partir dessas experiências, ela percebeu que o mundo fashion colocava em destaque um grupo seleto de corpos que não condizem com a diversidade do mundo real. 

“O Moda Em Rodas foi criado em outubro de 2015 a partir de uma insatisfação e um desejo pessoal. O primeiro foi o de não me ver representada nas editorias de moda, nos desfiles e nem entre as blogueiras e influenciadoras digitais que tratassem exclusivamente do tema. E o segundo foi que, no auge dos meus 30 anos, eu senti a necessidade de criar um projeto pessoal, mas que tivesse, por trás, um cunho social”, expõe a criadora de conteúdo. 

Falta de acessibilidade 

Rocha explica que o primeiro passo para que a moda seja mais acessível é através da mudança de olhar. A indústria precisa enxergar as pessoas com deficiência como potenciais consumidores. “Na realidade, a sociedade, como um todo, tem em mente que nós, pessoas com deficiência, consumimos apenas cadeiras de rodas, andadores, carros adaptados e por aí vai. E essa impressão que este mercado tem em relação a nós está presente em todas as áreas da moda”, conta Helo. 

Você já reparou que as lojas de roupas não são adaptadas para pessoas com deficiência? E que geralmente os provadores maiores direcionados para esse público estão sendo utilizados por pessoas sem deficiência ou como depósito? A Heloisa ressalta a importância de treinamentos direcionados aos vendedores para atender um cliente com deficiência, sem contar a falta que fazem as ferramentas de acessibilidade no e-commerce, principalmente nesse momento de pandemia de Covid-19. 

Confira o vídeo exclusivo da Heloisa para o Conectados News!


Caroline Bastos, estudante de jornalismo e criadora
de conteúdo | Foto: Arquivo pessoal

Caroline Bastos, 21 anos, é estudante de jornalismo, ou quase jornalista, como ela mesma se apresenta. Ela tem paraplegia flácida, que é a paralisia de uma parte ou da totalidade do tronco, pernas e dos órgãos pélvicos. A estudante é criadora de conteúdo no Instagram @oiecarols, no qual fala sobre moda, beleza e deficiência. 

“Eu acredito que sempre gostei de moda, mas fui me interessar e pesquisar mais sobre ela, dois anos atrás, quando me perguntaram se eu poderia falar sobre moda inclusiva em uma palestra. Eu nem conhecia moda inclusiva, então eu fui aprendendo junto na palestra, observando, descobrindo mais coisas sobre mim e sobre a moda. Então, a partir desse momento em que eu me vi na moda, que vi que eu poderia fazer realmente parte dela, foi quando eu me interessei muito mais por ela e estou nesse meio agora na internet”, conta a quase jornalista. 

Fato é que a Carol, como prefere ser chamada, também questiona a falta de inclusão na indústria da moda, até se refere como “falsa acessibilidade”. Ela também destaca que a moda deve pensar na funcionalidade da roupa para pessoa com deficiência. Deve ser colocado em cheque se a pessoa consegue vestir com facilidade, sozinha ou com a ajuda do cuidador. Deve-se pensar, também, na publicidade, escolhendo pessoas com deficiência para serem a cara da marca ou da coleção de roupas. 

Representatividade 

“Eu não sou representada e eu não me sinto representada, quando eu passei a seguir um monte de pessoas com deficiência como eu na internet, no meu Instagram, nas minhas redes sociais eu pude começar a sentir um pouquinho dessa representatividade chegando na minha vida. Mas, antes disso, não, eu nunca pensei que veria uma pessoa com deficiência em desfile de moda”, explica Carol. Apesar de comemorar pequenas conquistas dentro do mundo fashion, essa representatividade precisa chegar para todos para que ela se sinta completa. 

“Eu queria me sentir representada e não por ego próprio ou egoísmo, mas porque eu faço parte do mundo e o mundo precisa ver todas as pessoas que existem nele, não somente pessoas selecionadas”, esclarece Carol. 
É interessante apontar que, assim como a jornalista Heloisa Rocha, a quase jornalista Caroline Bastos também acredita que a moda deve mudar o seu olhar, “abrir os olhos”, como se refere. Para as duas, a moda precisa começar a colocar a pessoa com deficiência como público alvo. A Carol evidencia que as marcas e os influenciadores devem demonstrar interesse pelas pessoas com deficiência, procurar saber quantas dessas pessoas consomem ou querem consumir o seu produto. 

Moda como forma de transformação 

“Quando eu conheci a moda inclusiva, eu me transformei, percebi que eu poderia fazer diferente. Quando encontrei a moda inclusiva, eu me encontrei como uma pessoa com deficiência. Pode parecer estranho, nunca me vi como uma pessoa com deficiência, nunca me vi uma pessoa com limitações, que tinha que superar a sua deficiência”, esclarece a criadora de conteúdo. 

Parte importante da transformação da Carol foi quando percebeu que a pessoa com deficiência não precisa buscar uma cura. Por viver em ambiente cristão, e acreditar em milagres, conta que muitas pessoas são condicionadas a nunca se aceitarem. “A partir do momento em que conheci a moda inclusiva, me vi desse jeito e eu não quis me excluir desse mundo, do mundo que a gente existe. Eu quis me aprofundar mais nele, e foi a partir da moda inclusiva que entendi meus direitos, minha capacidade. Foi onde consegui entender algumas coisas que aconteciam comigo e também entender como eu poderia fazer para quebrar essas barreiras que a sociedade põe pra gente. Que eu não preciso superar minha deficiência, mas que eu preciso superar uma sociedade capacitista”, explana a @oiecarols. 

A transformação que a moda inclusiva fez na vida dela pode ser feita na vida de muitas outras pessoas também. Pensando nisso, a estudante acredita que somente a indústria da moda se educando e a população com deficiência se mobilizando para exigir o seu espaço é que a moda vai ser democratizada. 

Confira o vídeo exclusivo da Carol para o Conectados News!



#PraCegoVer:

Foto 1: A Heloisa está com uma blusa branca com detalhes em azul claro, usando argolas douradas na orelha. Ela está posando com a mão no cabelo, seu rosto está um pouco virado para o lado. O fundo da foto é composto com muretas de madeira e grama verde. 

Foto 2: A Carol está vestida com flores vermelhas na cabeça, veste um vestido azul, com flores grandes amarelas, vermelhas e azuis, por cima de seu vestido está um tecido azul marinho. Usa brincos, colares grandes e pequeno e anéis dourados. Ela está sentada em uma cadeira de rodas apoiando suas mãos em uma das rodas. O fundo é um jardim, tem um muro de concreto, árvores e plantas verdes e uma grama falha verde. 

Até a próxima!

0 comentários